sábado, 4 de junho de 2016

Coração de Jesus, Nossa Paz e Reconciliação

... e de reconciliar a ambos com Deus em um só Corpo, por meio da cruz, na qual ele matou a inimizade. (Ef 2,16-17)
Meditação de São João Paulo II:

1. Recitando com fé esta bela invocação da ladainha do Sagrado Coração, um sentimento de confiança e de segurança invade nossa alma. Jesus é verdadeiramente nossa paz, nossa suprema reconciliação.
Jesus é nossa paz. É conhecida a significação bíblica do termo "paz". Ele quer dizer, em síntese, o conjunto dos bens que Jesus, o Messias, outorgou aos homens. Eis por que o dom da paz marca o início de sua missão na terra, acompanha seu desenvolvimento e constitui seu coroamento. "Paz", cantam os anjos ao lado do berço do recém-nascido "príncipe da paz" (Lc 2,14; Is 9,5). "Paz" é o desejo, o anelo que brota do Coração de Cristo, comovido pela miséria do homem enfermo no corpo ou no espírito (Lc 8,48; Lc 7,50). É a saudação luminosa do ressuscitado a seus discípulos (Lc 24,36; Jo 20,19-26), os quais ele confia, no momento de deixar esta terra, à ação do Espírito, fonte de "amor, alegria e paz" (Gl 5,22).
2. Jesus é, ao mesmo tempo, nossa reconciliação. Após o pecado produziu-se profunda e misteriosa fratura entre Deus, o Criador, e o ser humano, sua criatura. Toda a história da salvação nada mais é que o relato admirável das intervenções de Deus em favor do homem para que este, na liberdade e no amor, voltasse a Ele; para que à situação de ruptura seguisse uma situação de reconciliação e de amizade, de comunhão e de paz.
No Coração de Cristo, cheio de amor para com o Pai e os homens, seus irmãos, teve lugar a perfeita reconciliação entre o Céu e a terra: "Nós fomos reconciliados com Deus pela morte de seu Filho" (Rm 5,10).
Quem desejar fazer a experiência da reconciliação e da paz deverá acolher o convite do Senhor e ir a Ele (Mt 11,28). Em seu Coração encontrará a paz e o repouso; nele sua dúvida se transformará em certeza, a inquietação em tranquilidade, a tristeza em alegria, a frustração em serenidade. Nele encontrará alívio para a dor, coragem para enfrentar o perigo, generosidade para não se entregar à fraqueza e para retomar o caminho da esperança.
3. O Coração de Mãe é em tudo semelhante ao do Filho. A bem-aventurada Virgem é também para a Igreja uma presença de paz e de reconciliação. Não foi ela quem recebeu, pelo anjo Gabriel, a maior mensagem de reconciliação e de paz que Deus jamais enviara ao gênero humano? (Lc 1,26-38).
Maria deu à luz aquele que é nossa reconciliação. Estava ao lado da cruz quando, no sangue de seu Filho, Deus reconciliou "com ele todas as coisas" (Cl 1,20). Agora, glorificada no céu, ela tem - como recorda uma oração litúrgica - "um coração cheio de misericórdia para com os pecadores, que voltam seu olhar para seu amor maternal; nela eles se refugiam e imploram o perdão" de Deus (Missal, Prefácio da Virgem Nossa Senhora).
Que Maria, Rainha da Paz, obtenha para nós junto a Cristo o dom messiânico da paz e da graça da reconciliação, plena e eterna, com Deus e com nossos irmãos. E para isso rezamos a Ela.
(Angelus - 3 de setembro de 1989)

Escreve o Padre Paschoal Rangel:
... para a Bíblia, Paz significa a harmonia e a união dos diferentes, que atravessam e superam o conflito, e se entendem ou se esforçam por entender uns aos outros, apesar das divergências tão naturais em seres com interesses, tipos, caracteres, formação diversos, às vezes até opostos. A paz bíblica é a concórdia que, segundo a lição de São Tomás de Aquino, consiste na união de corações (cum-corde), ainda quando as ideias divirjam. A diferença de pontos de vista não precisa ser uma discórdia, isto é, uma separação de corações. 
A Bíblia vê na paz, no shalom, um rico acúmulo de bens espirituais e materiais harmoniosos, desde a fé que une Deus e o homem, e os homens; a fidelidade que liga as pessoas pela palavra dada e confere segurança às relações humanas; a aliança, a alegria de ter parceiros e companhia; até a graça e a benevolência do Senhor, a prosperidade, a tranquilidade interior, a santificante presença de Deus em nós. 
A Escritura ajunta a paz e reconciliação-com-Deus: "Justificados pela fé, temos paz com Deus" (Rm 5,1). Esta paz nos é dada por Jesus Cristo, de quem São Paulo diz que "é a nossa paz" (Ef 2,14). Aliás, mesmo no Antigo Testamento, os profetas atribuíam o Messias o título de "Príncipe da Paz" (Is 9,6), a quem Miquéias chegou a chamar simplesmente de "nossa paz" (Mq 5,5). 
A Ladainha reata paz e reconciliação. Sabiamente. Belamente. Pois reconciliar é trazer de novo a paz, o acordo, a vigência da aliança. E nada é tão forte quanto Jesus para nos reconciliar. Ele é o reconciliador por excelência: "Quando éramos inimigos (de Deus), fomos com Ele reconciliados pela morte de seu Filho" (Rm 5,10). Tendo recebido a reconciliação por meio dele (Rm 5,11), recebemos do Pai pelo Filho tudo o mais, a paz inclusive, a paz-plenitude-de-bens, e ainda "o ministério da reconciliação" (2Cor 5,18-19). Ministério que inclui a administração dos sacramentos mas também a palavra (pregação, ensino, evangelização), que cria o clima de paz e entendimento entre os homens. "E nos deu a palavra da reconciliação", isto é, o poder de pregar a reconciliação e anunciar a paz (2Cor 5,19).Com toda razão, pois, invocamos: "Coração de Jesus, nossa paz e reconciliação, tende piedade de nós".




Notas:

RANGEL, Paschoal. Sagrado Coração do Homem. Belo Horizonte: O Lutador, 1993.

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